segunda-feira, 16 de agosto de 2010

REALISMO E NATURALISMO

TEXTO I – SÉCULO XIX - A ERA DAS REVOLUÇÕES

O século XIX foi pródigo em transformações de toda ordem: políticas, econômicas, sociais, filosóficas e, sobretudo, científicas. Essas mudanças determinaram os rumos do século XX e obrigaram à reformulação de várias perspectivas tidas como fundamentais até então.
O capitalismo industrial já estava em curso, criando uma nova elite e uma nova burguesia. No momento pós-abolição da escravatura, eram impingidos salários miseráveis à numerosa classe proletária, gerando conturbações sociais.
As ciências fervilhavam de descobertas, especialmente as ligadas à Biologia, levando a novas concepções filosóficas e à revisão de conceitos religiosos consagrados.
Dentre as correntes de pensamento, destacamos o Positivismo, o Determinismo, o Evolucionismo, o Marxismo; e a Psicanálise, desenvolvida por Sigmund Freud.

O RACIONALISMO POSITIVISTA DE COMTE
O amor por princípio, a ordem por base, o progresso por meta.
Augusto Comte (1798-1857) só admite as verdades positivas, ou seja, as científicas, aquelas que emanam do experimentalismo, da observação e da constatação, e repudia a metafísica. Para ele só cinco ciências são relevantes: a Astronomia, a Física, a Química, a Fisiologia e a Sociologia, em ordem de importância. Esta última, pela sua complexidade, permitiria reformas sociais. Crê também que a finalidade do saber científico é a previsão, "saber para poder". Sua primeira obra chamou-se Plano dos Trabalhos Científicos para Reorganizar a Sociedade (1822), rebatizada, mais apropriadamente, em sua segunda edição, de Sistema de Política Positivista (1824).
Sua teoria objetiva a retomada de uma "ordem" que visa suprimir a indisciplina dos costumes. Para isso é preciso renunciar à busca do absoluto, o que turva o caminho das ciências positivas. No âmbito socioeconômico, Comte propõe uma organização eminentemente racional, que se direcione para os interesses coletivos, neutralizando os motivos de guerra e discórdia entre as nações.
Comte acreditava que é possível alcançar qualquer objetivo, desde que se saiba também imprimir às situações as causas necessárias à obtenção dos objetivos desejados.

O SOCIALISMO DE MARX
Um espectro ronda a Europa. Em 1848, os economistas e filósofos alemães KarI Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895) publicaram o Manifesto Comunista, destinado sobretudo à classe operária, pretendendo despertar a consciência de classes. Pregava-se uma revolução internacional que derrubasse a burguesia e o sistema capitalista, e implantasse o comunismo. A pedra fundamental do marxismo está na idéia de socialização dos meios de produção. Em O Capital, obra de Marx, estão os principais conceitos do marxismo.
Karl Marx considerava inevitável a ação política do proletariado na sociedade burguesa, o que inauguraria a construção de uma nova sociedade. Num primeiro momento seriam instalados o controle do Estado através da ditadura do proletariado e a socialização de todos os meios de produção, não existindo mais a propriedade privada. O objetivo final desta revolução seria o comunismo, que representaria o fim de todas as desigualdades sociais e econômicas (a superação do capitalismo). Entre termos importantes e conceitos marxistas, destacamos: “Luta de classes”(confronto entre proletariado e burguesia), “Mais valia” (nome dado por Karl Marx à diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o salário pago ao trabalhador, que seria a base do lucro no sistema capitalista), “Socialistas utópicos” (eram assim denominados pelos marxistas – que se auto-denominavam socialistas científicos – por defenderem os princípios de uma sociedade ideal sem indicar os meios para alcançá-la. Os pensadores Saint-Simon [1760-1825], Charles Fourier [1772-1837], Louis Blanc [1811-1882] e Robert Owen [1771-1858], estão entre os socialistas chamados de utópicos, cujo nome vem do livro Utopia de Thomas More [1478-1535]), “Socialismo científico” (Teoria política elaborada por Karl Marx e Friedrich Engels entre 1848 e 1867. Corrente deriva da dialética [resultado da luta de forças opostas] hegeliana e influenciada pelo socialismo utópico e pela economia inglesa da época. Com a teoria conhecida por materialismo histórico, Marx prevê o triunfo final dos trabalhadores sobre a burguesia.e chama de comunismo a essa sociedade e de socialismo ao processo de transição do capitalismo ao comunismo).

O ANARQUISMO DE PROUDHON
Pierre-Joseph Proudhon (Besançon, 15 de Janeiro de 1809 — Paris, 19 de Janeiro de 1865) Anarquista, filho de família muito pobre, foi pastor de pequeno rebanho de gado quando criança. Em 1840 publica um livro que o torna conhecido, seu ensaio “Qu'est-ce que la propriété?”, afirma “La propriété c'est le vol” (“A propriedade é o roubo”) e, em seu livro “Les confessions d'un révolutionnaire”, defende que “l'anarchie c'est l'ordre “ (“A anarquia é a ordem”). “A propriedade é o roubo” o leva à justiça, mas é absolvido.
As idéias de Proudhon eram opostas ao liberalismo. Denunciavam a organização econômica, governamental e educacional, propondo a criação de sociedades cooperativas de produção. Segundo ele, o homem deveria abandonar a condição econômica e moral baseada na sujeição a outros homens - que levaria à desarmonia social. A nova sociedade deveria apoiar-se no mutualismo, uma forma de cooperação baseada em associações, sem o poder coercitivo do Estado.

O EVOLUCIONISMO DE DARWIN
Ora, enquanto o nosso planeta, obedecendo à lei fixa da gravitação, continua a girar na sua órbita, uma quantidade infinito de belas e admiráveis formas, originadas de um começo tão simples, não cessou de se desenvolver e desenvolve-se ainda! (Origem das Espécies)
A obra Origem das Espécies (1859) foi elaborada pelo naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), que retomou a teoria da evolução das espécies de Lamark, apoiando-se ainda em experimentos de seleção artificial da cultura de plantas e de criação de animais. Darwin elaborou a teoria da seleção natural, defendendo que a concorrência entre as espécies eliminaria os organismos mais fracos, permitindo à espécie inteira evoluir, graças às heranças genéticas favoráveis dos indivíduos mais fortes e mais aptos. A teoria da evolução abrange também a espécie humana e é apoiada pela Paleontologia, ciência que estuda os fósseis, e que demonstra existirem espécies intermediárias entre as fósseis e as vivas. Darwin demonstrou cientificamente que os seres humanos e os macacos têm um antepassado em comum — questionando assim a criação do mundo baseada no Gênesis bíblico, e colocando em discussão a existência de Deus, o que criou um escândalo na sociedade da época.

O DETERMINISMO DE TAINE
Todo acontecimento é uma conseqüência necessário de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos anteriores.
Essa corrente foi desenvolvida por Hipólito Adolfo Taine (1828-1893), que aplicou o método experimental das Ciências Naturais às diversas produções do espírito humano. Taine afirmava que o comportamento humano era condicionado pelas influências de raça, de contexto histórico e de meio-ambiente.

A PSICANÁLISE DE FREUD
Desta forma, voltando o olhar para o trabalho de minha vida, posso dizer que iniciei muitas coisas e sugeri outras, das quais disporá o futuro. Não posso, porém, predizer o que chegarão a fazer. Freud
Sigmund Freud (1856-1939), médico neurologista, lançou-se no caminho para a fundação da Psicanálise estudando os efeitos da cocaína com o psiquiatra Meynert, em 1883. Dois anos depois, estagiou em Paris com Charcot, o grande neurologista francês, que fazia experimentos com a hipnose, espécie de sono induzido, durante o qual o paciente se torna muito sugestionável, e revela o que vai nas camadas não conscientes de seu psiquismo. Em 1886, abre seu consultório em Viena, onde usou o método hipnótico, substituindo-o depois por outros recursos como perguntas e livres-associações que permitem que sejam descobertos traumas que deram origem às neuroses. Aos poucos, elaborou sua Teoria do inconsciente, que tem como principais noções:
a) Inconsciente: parte do psiquismo humano constituída daquilo que não pode chegar à consciência; são desejos e fantasmas inaceitáveis do ponto de vista moral ou social, que ficam recalcados, mas são dotados de uma força que altera as funções conscientes. Ele representa, segundo Freud, nove décimos das funções psíquicas do indivíduo.
b) Censura: aquilo que impede o acesso à consciência dos desejos recalcados.
c) Recalcamento: mecanismo que rejeita e mantém fora da consciência o que é inconciliável com as exigências sociais ou morais.
d) Libido: energia que move os instintos de vida, determinando as funções criadoras ativas do indivíduo, particularmente do impulso sexual. Freud escandalizou o mundo afirmando que a libido é inata e que, portanto, as crianças também a apresentam. Para ele, o impulso sexual é o centro das tendências afetivas.
e) Sonho: ocupa 20 a 30 por cento do tempo de sono do indivíduo. O sono, segundo a Psicanálise, teria a função de burlar a censura, de modo que os desejos prisioneiros do recalcamento na vida diurna pudessem se manifestar. Eles viriam disfarçados para atravessarem a censura e serem aceitos pela consciência.
Em sua segunda teoria do aparelho psíquico, Freud dividiu o psiquismo humano em três partes:
a) Id: conjunto dos impulsos inconscientes, de origem biológica, ou recalcados, dominado pelo princípio do prazer e pelo desejo impulsivo; é a parte mais profunda da psique, receptáculo dos impulsos instintivos.
b)Ego: do latim, ego, "eu". É a parte mais superficial do id, que é modificada, através dos sentidos, pela influência do mundo exterior. Ao ser tornada consciente, tem por funções a comprovação da realidade e a aceitação, através de seleção e controle, de parte dos desejos e exigências procedentes dos impulsos que emanam do id.
c) Superego: é o "eu ideal". Desempenha a função de juiz, trabalha para a formação da consciência moral provocando recalcamento exercido pela censura. Integra o indivíduo à sociedade e parte da interiorização da autoridade e das proibições dos pais nas crianças.
Freud afirma que as neuroses são motivadas pelo choque entre o id e o ego. Grande parte delas seria causada por traumas de infância: frustrações ou experiências negativas não superadas. A neurose é a intervenção de um fato negativo passado que continua intervindo de forma nefasta no presente.
O Complexo de Édipo é uma das partes mais fundamentais da teoria da Psicanálise. Ele encontra sua substância no mito de Édipo Rei, do dramaturgo grego Sófocles. Trata basicamente da rivalidade que o menino vê no pai, que disputa com ele o amor da mãe, objeto do desejo daquele. A mãe é o primeiro modelo feminino para os garotos, e esse "triângulo amoroso" será a matriz dos relacionamentos vindouros. No caso das meninas, o que ocorre, segundo Freud, é a atração pelo pai e a rivalidade com a mãe, o que foi chamado de Complexo de Electra.


TEXTO II - NATURALISMO
Em 1867, Émile Zola edita Thérèse Raquin, dando início ao Naturalismo, propondo um método científico para escrever: coleta de dados, formulação de hipóteses, criação de personagens para comprovar a validade dessas hipóteses. Esses princípios estão expostos em O Romance Experimental. Outra obra de destaque de Zola é O Germinal.

REALISMO/NATURALISMO
O Realismo e o Naturalismo têm princípios comuns, como a objetividade, o universalismo, a correção e clareza de linguagem, o materialismo, a contenção emocional, o antropocentrismo, o descritivismo, a lentidão da narrativa, a impessoalidade do narrador. Cabe lembrar que o Naturalismo é uma ramificação cientificista do Realismo. Distinguem-se em vários pontos, uma vez que tinham objetivos diferentes. Vamos destacar algumas dessas peculiaridades entre as duas estéticas.

DIFERENÇAS ENTRE REALISMO E NATURALISMO
Os escritores realistas propõem-se a fazer o "romance de revolução", pretendendo reformar a sociedade por meio da literatura crítica. Preferem trabalhar com um pequeno elenco de personagens e analisá-los psicologicamente. Esperavam que os leitores se identificassem com as personagens e as situações retratadas e, a partir de uma auto-análise, pudessem transformar-se. Tratava-se, portanto, de um trabalho de educação intelectual e moral, que pretendia converter-se em transformação social.
Já os naturalistas, comprometidos com a ótica cientificista da época, objetivavam desenvolver o "romance de tese", no qual seria possível a demonstração das diversas teorias científicas. Tinham uma perspectiva biológica do mundo, reduzindo, muitas vezes, o homem à condição animal, colocando o instinto sobre a razão. Os aspectos desagradáveis e repulsivos da condição humana são valorizados, como uma forma de reação ao idealismo romântico. Os naturalistas retraíam preferencialmente o coletivo, envolvendo as personagens em espaços corrompidos social e/ou moralmente, pois acreditavam que a concentração de muitas pessoas num espaço desfavorável fazia aflorar os desvios psicopatológicos — um alvo de interesse desses escritores, o que denota uma visão determinista, em que o meio e o contexto histórico têm influência.

TEXTO III - O REALISMO-NATURALISMO
O termo realismo designa a tendência que caracteriza os autores fortemente apegados à chamada descrição "fiel" das coisas e da sociedade. Toma-se, portanto, como o contrário de romantismo. O movimento realista surgiu como desgaste e superação da literatura romântica. Aliás, grandes realistas, como Balzac ou Standhal, Gogol ou Charles Dickens, tinham sido românticos e quase naturalmente foram chegando a formas menos idealizadas da vida, até retratarem a sociedade moderna em sua nudez crua e opressiva. Esse é o caso de Machado de Assis, a partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), que inaugura nosso realismo.
Não há uma forma única de realismo. O que acabamos de ver no parágrafo anterior poderia chamar-se "grande realismo" moderno. E o realismo que produziu obras-primas da literatura contemporânea. Entretanto, os livros didáticos costumam falar mais em realismo-naturalismo ou realismo naturalista. Este dificilmente produziu alguma grande obra. A diferença básica entre os dois realismos é a seguinte: enquanto os primeiros são grandes narradores, pois sabem captar a essência dramática da vida, com sua incrível variação de caracteres, os realistas-naturalistas tomam uma posição de analistas da sociedade, munem-se de métodos "científicos" e transformam-se em observadores. Isto acabaria empobrecendo seu campo de ação, por várias razões. Em primeiro lugar, na condição de retratistas, perdem o senso do elemento criativo, perdem em capacidade de ficção e invenção, pois antes de mais nada são observadores. Em segundo lugar, têm uma concepção muito limitada do ser humano, que é aquela que vem da pesquisa científica (medicina, biologia, sociologia, etc.). Finalmente, sua preocupação de denúncia e descrição acaba empobrecendo o horizonte dos personagens, cujo destino se limita apenas a comprovar as teses cientificistas do autor. Este quer demonstrar que o homem é um escravo da sociedade ou de seu próprio corpo. Tenta demonstrar que o corpo humano é controlado por Leis que transcendem a vontade e a moral do homem. Que resulta disso? Resulta que o personagem é apenas um exemplo, um caso clínico, que serve para ilustrar as regras gerais. Analisemos as regras de Taine, pensador bastante respeitado nos círculos naturalistas. Taine dizia que o homem vem a ser produto do meio ambiente; produto da raça a que pertence; produto do momento histórico. Isso deve ter algum fundo de verdade, pois todo mundo sabe que essas coisas pesam numa pessoa. Entretanto, isso não significa que o homem seja apenas produto passivo. Pelo contrário, ele pode agir, modificar ou contestar o universo que o cerca. Em geral, é isso que acontece com os lideres sociais, com os heróis, com os santos e grandes administradores que conhecemos ao longo da história universal. Acontece que, no naturalismo, não há lideres, nem heróis, nem santos, nem grandes administradores. No naturalismo existe o protagonista principal, que é pessoa igual a qualquer outra, e deve ser vitima como qualquer outra. Vitima da fatalidade das leis naturais. Por exemplo, um padre (prato predileto do naturalismo). É bom, religioso, dedicado. Isso de nada adianta diante das leis naturais, por exemplo, a lei da necessidade sexual. Então, o padre sucumbe ante a provocação de uma mulher. Isso é batata. É só pegar um romance naturalista em que haja padre, pra ver como o autor faz questão de provar que a carne é fraca até para as pessoas que deveriam ser muito fortes. O naturalismo é preconceituoso, pois não imagina que uma pessoa possa ser diferente. Iguala todo mundo, porque todo mundo é dominado pelas mesmas leis naturais. Por isso, o romance naturalista não surpreende. Você já imagina o que vai acontecer. É como um teorema. Dados tais elementos, derivam-se tais e tais. Pronto. Está feito o romance. Claro que estamos falando por alto. Mas no fundo é isso mesmo.
Finalmente, há um terceiro tipo de realismo, que chamaremos esteticista, preocupado com a beleza da expressão lingüística. E o momento em que o romancista descobre que seu veículo, o romance, é, antes de tudo, linguagem. Então, ele analisa os objetos com minúcia, mas em função do aprimoramento da linguagem, da sua capacidade em traduzir os refinamentos mais sutis que se possa conceber. E o caso de Gustave Flaubert e seu célebre Madame Bovary (1857). No Brasil, foi o caso de Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas e Raul Pompéia, com O Ateneu.
(RODRIGUES, Medina A. et al. Antologia da literatura brasileira. Textos comentados. Vol. I, do Classicismo ao pré-modernismo. São Paulo: Marco, 1979).


Texto IV – Germinal
*CLIQUE AQUI E VEJA O FILME GERMINAL

 
Germinal é um romance do escritor Emile Zola, o décimo terceiro da série Les Rougon-Macquart e porventura um dos mais famosos.
A cena tem lugar no norte da França enquanto uma greve provocada pela redução de salários. Além dos aspectos técnicos das extrações minerais e as condições de vida nos agrupamentos dos mineiros, Zola também descreve o princípio das organizações política e sindical da classe operária divididas entre marxistas e anarquistas.
Para compor Germinal, o autor passou dois meses trabalhando como mineiro na extração de carvão. Viveu com os mineiros, comeu e bebeu nas mesmas tavernas para se familiarizar com o meio. Sentiu na carne o trabalho sacrificado, a dificuldade em empurrar um vagonete cheio de carvão, o problema do calor e a umidade dentro da mina, o trabalho insano que era necessário para escavar o carvão, a promiscuidade das moradias, o baixo salário e a fome. Além do mais, acompanhou de perto a greve dos mineiros. 
(Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre, com adaptações)
Germinal - Émile Zola
"Meu papel foi recolocar o homem no seu lugar dentro da criação, como um produto da terra, submetido ainda a todas as influências do meio; e no próprio homem coloquei em seu lugar o cérebro, um órgão entre outros órgãos, porque não creio que o pensamento seja outra coisa além de uma função de matéria." (Émile Zola)
Émile Zola, francês, foi o criador do gênero de romance naturalista, influenciando autores muito importantes da literatura em língua portuguesa, como Eça de Queirós e Aluísio de Azevedo. Vivendo nas décadas finais do século XIX, em que a fé no progresso e o culto à ciência imperavam nos círculos intelectuais em nível praticamente mundial, o estilo de Zola decorre de uma fusão do romance realista de Balzac, Stendhal e Flaubert, baseados na crítica de costumes sociais, com autores da biologia e da medicina, como Darwin e Claude Bernard. Da fusão do realismo com a biologia, Zola criou a escola naturalista, em que a análise social, crítica, do comportamento de seus personagens busca fundamentos no conhecimento científico da biologia de sua época. Assim, as características mais marcantes de sua obra, presentes também nos demais autores naturalistas, são: 
I. Em primeiro lugar, a visão do homem como um animal, movido pela eterna satisfação de suas necessidades biológicas e pela adaptação ao seu meio. Repetidas vezes, Zola descreve as ações e o comportamento de seus personagens humanos como próprias de animais, ou então descreve animais como dotados de comportamento quase humano (como o cavalo Batalha, o "filósofo").
II. Em segundo lugar, a ação humana é muito influenciada por questões patológicas na obra de Zola. O desenvolvimento da vida de seus personagens depende muito das doenças as quais os mesmos estão submetidos. Obviamente, isso decorre da busca de fundamentação científica para descrever o comportamento humano pelo autor. Assim, enquanto os mineradores, por estarem em contato com mais doenças, já são descritos fisicamente e psicologicamente como adultos logo na puberdade, os jovens burgueses mesmo depois dos vinte anos ainda são vistos como crianças.
III. O determinismo pelo meio. Sendo o homem um animal como todos os outros, vive em busca de se adaptar ao seu meio. Portanto, o meio é um fator determinante ao comportamento humano; é mais forte do que qualquer ação individual. No livro, por mais que fosse sofrida a vida dos mineiros de Montsou, eles nunca conseguiam viver sem trabalhar nas minas, ou então ir embora. Eles parecem biologicamente presos a sua condição, passando de geração para geração.
IV. O instinto. Apesar de viver em uma época em que as pessoas intelectualizadas tinham plena fé no desenvolvimento científico e na racionalidade humana, Zola põe na irracionalidade, isto é, nos surtos emocionais de seus personagens, um fator de extrema importância no enredo. Por exemplo, a revolta dos mineradores contra seus patrões decorre muito mais do simples ódio de classe do que um movimento racional para elevar os seus salários.
V. O niilismo. O sofrimento e a injustiça são elementos freqüentes no comportamento humano. Mas, para uma sociedade de animais medíocres, irracionais e presos ao seu meio, por mais revoltante que ele seja, como a sociedade humana, melhoras são praticamente impossíveis.
Em termos de enredo, o livro conta a história de Etienne, um trabalhador qualificado com impulsos socialistas, que por ser demitido de seu antigo emprego por brigar com seu ex-patrão, consegue um emprego de minerador em Montsou. Trabalhando com os demais mineradores, muito mais embrutecidos que ele, Etienne acaba se incorporando ao ambiente de pobreza, promiscuidade e ignorância da comunidade de mineradores. Contudo, por sua natureza socialista e intelectual o faz tornar-se um líder carismático de sua comunidade, incitando os trabalhadores contra seus patrões. Contudo, antes de provocar um luta de classes no sentido marxista do termo, o personagem provoca uma revolta dos humanos contra o seu meio natural, que é muito mais forte do que eles.
A corrente de romance naturalista, mesmo que tenha sido fundamental para o desenvolvimento da literatura ocidental no final do século XIX, e tendo influenciado muitas das escolas modernas, tem a sua metodologia de análise do comportamento humano bastante ultrapassada aos olhos da ciência dos dias atuais. Atualmente, os pesquisadores sociais não acreditam mais no determinismo sobre o homem, isto é, fatores ambientais, patológicos e sociais podem influenciar o comportamento humano em uma escala que depende de indivíduo para indivíduo. Mas há um fator de individualidade (presente inclusive no DNA de cada pessoa) que não pode ser descartado sobre o comportamento, que diferencia as pessoas entre si, e que as fazem tomar ações distintas e criativas, podendo dessa forma se desvincular de seu meio social. 

VEJA O FILME  GERMINAL 

EXERCÍCIOS:
Agora, sobre o filme (adaptado do livro) O Germinal que você viu, responda às seguintes perguntas:

1. Qual personagem de O Germinal encarna o Socialista utópico (idealista)? Quais são as suas características? Qual o personagem encarna o anarquismo? Quais atitudes o denunciam como defensor das idéias anarquistas?
2. Cite situações descritas no livro e mostradas no filme que denuncie as péssimas condições de trabalho do proletariado trabalhador das minas de carvão. E quais são as características comportamentais da burguesia no filme?
3. Explique a luta de classes em O Germinal?
4. O que é superação do capitalismo, segundo Karl Marx? Há alguma citação a superação do capitalismo em O Germinal?
5. Identifique o conflito social na sociedade ocidental após a abolição da escravatura e incremento da revolução industrial (final do século XIX).
6. Nesse mesmo período, como se encontrava o progresso científico e tecnológica.
7. Relacione o pensador, a idéia por ele defendida e sua influência sobre a concepção de mundo da época.

Autor
Concepção
Influência de suas idéias
Augusto Comte


Karl Marx/ Friedrich Engels


Darwin


Hipolite Taine


Sigmund Freud



8. Analise o momento histórico em que surgem as idéias defendidas pelos pensadores da questão anterior. Por que suas propostas ousadas de reinterpretar o mundo vingaram naquele momento (2ª metade do século XIX) e não num período anterior ou posterior?
9. Identifique as obras iniciais do Realismo e do Naturalismo europeu, respectivamente.
10. Diferencie o Realismo do Naturalismo.

Questões sobre o Texto III.
11. Como foi, via de regra, a transição dos autores românticos para o realismo?
12. Compare a postura de românticos e realistas ante a realidade.
13. Identifique as características comuns à prosa realista e naturalista.
14. Leia os dois fragmentos abaixo e enquadre-os como realista ou naturalista. Justifique.












Fragmento I -- O CORTIÇO, de Aluísio de Azevedo

Pombinha abria muito a bolsa, principalmente com a mulher de Jerônimo, a cuja filha, sua protegida predileta, votava agora, por sua vez, uma simpatia toda especial, idêntica à que noutro tempo inspirara ela própria à Léonie. A cadeia continuava e continuaria interminavelmente; o cortiço estava preparando uma nova prostituta naquela pobre menina desamparada, que se fazia mulher ao lado de uma infeliz mãe ébria.
E era, ainda assim, com essas esmolas de Pombinha, que na casa de Piedade não faltava de todo o pão, porque já ninguém confiava roupa à desgraçada, e nem ela podia dar conta de qualquer trabalho.
Pobre mulher! chegara ao extremo dos extremos. Coitada! já não causava dó, causava repugnância e nojo. Apagaram-se-lhe os últimos vestígios do brio; vivia andrajosa, sem nenhum trato e sempre ébria, dessa embriaguez sombria e mórbida que se não dissipa nunca. O seu quarto era o mais imundo e o pior de toda a estalagem; homens malvados abusavam dela, muitos de uma vez, aproveitando-se da quase completa inconsciência da infeliz. Agora, o menor trago de aguardente a punha logo pronta; acordava todas as manhãs apatetada, muito triste, sem animo para viver esse dia, mas era só correr à garrafa e voltavam-lhe as risadas frouxas, de boca que já se não governa. Um empregado de João Romão que ultimamente fazia as vezes dele na estalagem, por três vezes a enxotou, e ela, de todas, pediu que lhe dessem alguns dias de espera, para arranjar casa. Afinal, no dia seguinte ao último em que Pombinha apareceu por lá com Léonie e deixou-lhe algum dinheiro, despejaram-lhe os tarecos na rua.
E a mísera, sem chorar, foi refugiar-se, junto com a filha, no "Cabeça-de-Gato" que, à proporção que o São Romão se engrandecia, mais e mais ia-se rebaixando acanalhado, fazendo-se cada vez mais torpe, mais abjeto, mais cortiço, vivendo satisfeito do lixo e da salsugem que o outro rejeitava, como se todo o seu ideal fosse conservar inalterável, para sempre, o verdadeiro tipo da estalagem fluminense, a legitima, a legendária; aquela em que há um samba e um rolo por noite; aquela em que se matam homens sem a polícia descobrir os assassinos; viveiro de larvas sensuais em que irmãos dormem misturados com as irmãs na mesma lama; paraíso de vermes, brejo de lodo quente e fumegante, donde brota a vida brutalmente, como de uma podridão.


 


Fragmento II -- DOM CASMURRO, de Machado de Assis

Com que então eu amava Capitu, e Capitu a mim? Realmente, andava cosido às saias dela, mas não me ocorria nada entre nós que fosse deveras secreto. Antes dela ir para o colégio, eram tudo travessuras de criança; depois que saiu do colégio, é certo que não estabelecemos logo a antiga intimidade, mas esta voltou pouco a pouco, e no último ano era completa. Entretanto, a matéria das nossas conversações era a de sempre. Capitu chamava-me às vezes bonito, mocetão, uma flor - outras pegava-me nas mãos para contar-me os dedos. E comecei a recordar esses e outros gestos e palavras, o prazer que sentia quando ela me passava a mão pelos cabelos, dizendo que os achava lindíssimos. Eu, sem fazer o mesmo aos dela, dizia que os dela eram muito mais lindos que os meus. Então Capitu abanava a cabeça com uma grande expressão de desengano e melancolia, tanto mais de espantar quanto que tinha os cabelos realmente admiráveis - mas eu retorquia chamando-lhe maluca. Quando me perguntava se sonhara com ela na véspera, e eu dizia que não, ouvia-lhe contar que sonhara comigo, e eram aventuras extraordinárias, que subíamos ao Corcovado pelo ar, que dançávamos na lua, ou então que os anjos vinham perguntar-nos pelos nomes, a fim de os dar a outros anjos que acabavam de nascer. Em todos esses sonhos andávamos unidinhos. Os que eu tinha com ela não eram assim, apenas reproduziam a nossa familiaridade, e muita vez não passavam da simples repetição do dia. alguma frase, algum gesto. Também eu os contava. Capitu um dia notou a diferença, dizendo que os dela eram mais bonitos que os meus, eu, depois de certa hesitação, disse-lhe que eram como a pessoa que sonhava... Fez-se cor de pitanga.

15. Para o autor do Texto III, qual das duas tendências produziu melhores obras literárias? Qual é sua justificativa para essa opinião?
16. Que pensador influenciou decisivamente a forma de os naturalistas encararem a postura do homem ante a realidade? O que ele defendia e como esse pensamento influiu na produção literária naturalista?
17.  O que diferencia o realismo esteticista? Cite obras e autores brasileiros que possam ser enquadrados como tais.

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Respostas dos exercícios:
1.       Enquanto o Capitalismo industrial estava em curso, criando uma nova elite e uma nova burguesia, eram impingidos salários miseráveis à numerosa classe proletária, gerando conturbações sociais, como a luta de classes, conflitos entre proletariado e burguesia (bem retratado no livro e filme GERMINAL).
2.      As ciências fervilhavam de descobertas, especialmente ligadas à biologia, levando a novas concepções filosóficas e à revisão de conceitos religiosos consagrados. Destacam-se as seguintes correntes de pensamento: o Positivismo, o Determinismo, o Evolucionismo, o Marxismo e a psicanálise de Freud.

3.       
Autor
Concepção
Influência de suas ideias
Augusto Comte
Positivista
Realismo, Naturalismo
Karl Marx/Friedrich Engels
Socialismo científico
Materialismo histórico
Naturalismo
Darwin
Evolucionismo
Naturalismo
Hipolite Taine
Determinismo
Naturalismo
Sigmund Freud
Psicanálise
Realismo

4.      A força crescente da concepção antropocêntrica, em contraposição à teocêntrica, e o esgotamento da visão idealizada do romantismo contribuíram como fatores para que estas ideias fossem defendidas na segunda metade do século XVIII.
5.      Os socialistas utópicos eram assim denominados porque defendiam os princípios de uma sociedade ideal, sem indicar os meios para alcançá-la.  Os socialistas científicos se baseavam na dialética hegeliana e defendiam a luta de classes como o meio de alcançar o socialismo. O anarquismo de Proudhon era oposto às ideias liberais, defendia que ideias contra a propriedade, denunciava a organização econômica, governamental e educacional, propunha a criação de sociedades cooperativas de produção e que os homens abandonassem a condição econômica e moral baseada na sujeição a outros homens.
6.      Os escritores realistas propõem-se a fazer o "romance de revolução", pretendendo reformar a sociedade por meio da literatura crítica. Preferem trabalhar com um pequeno elenco de personagens e analisá-los psicologicamente. Esperavam que os leitores se identificassem com as personagens e as situações retratadas e, a partir de uma auto-análise, pudessem transformar-se. Tratava-se, portanto, de um trabalho de educação intelectual e moral, que pretendia converter-se em transformação social. Já os naturalistas, comprometidos com a ótica cientificista da época, objetivavam desenvolver o "romance de tese", no qual seria possível a demonstração das diversas teorias científicas. Tinham uma perspectiva biológica do mundo, reduzindo, muitas vezes, o homem à condição animal, colocando o instinto sobre a razão. Os aspectos desagradáveis e repulsivos da condição humana são valorizados, como uma forma de reação ao idealismo romântico. Os naturalistas retratavam preferencialmente o coletivo, envolvendo as personagens em espaços corrompidos social e/ou moralmente, pois acreditavam que a concentração de muitas pessoas num espaço desfavorável fazia aflorar os desvios psicopatológicos — um alvo de interesse desses escritores, o que denota uma visão determinista, em que o meio e o contexto histórico têm influência.
7.      Etienne é o Socialista utópico, com discurso inflamado, carregado de impulsos socialistas; no filme, o personagem que é o anarquista é o que provoca a inundação da mina, em uma determinada cena, ele defende ações radicais e violentas, deixando escapar uma visão negativa da realidade.
8.     A fome, a miséria da condição de vida, as doenças. A burguesia se comporta de modo infantilizado (os jovens) e imoral (os adultos), com comportamento adúltero.
9.      Em GEMINAL, a classe proletária chega ao limite da condição humana quando decide por uma greve que acaba levando a um conflito físico que acaba levando muitas pessoas à morte.
10.  Segundo Karl Marx, o capitalismo chegará ao seu limite, quando não terá mais para onde evoluir e, então, será substituído pelo socialismo. O discurso inflamado e utópico de Etienne conduz a uma visão de mundo sem capitalismo.
11.   Houve um desgaste e superação da literatura romântica.
12.  A visão romântica é idealizada, enquanto a visão realista busca a fidelidade à realidade.
13.  A objetividade, o universalismo, a correção e a clareza da linguagem, o materialismo, a contenção emocional, o antropocentrismo, o descritivismo, a lentidão da narrativa, a impessoalidade do narrador.
14.  O Cortiço: Naturalista, pois a cena retrata o determinismo de Taine, com Pombinha se transformando em prostituta e sua mãe enlouquecendo; Dom Casmurro: Realista, por que a narrativa possui característica psicológica, com influência de Freud.
15.   O Realismo produziu obras melhores, na opinião dele. A preocupação com a denúncia das mazelas sociais acaba empobrecendo as obras Naturalistas, segundo o autor.
16.  Karl Marx, que defendia a Luta de Classes, influenciou na escolha de personagens excluídos dos textos Naturalistas.
17.   É aquele preocupado com a beleza da expressão lingüística. E o momento em que o romancista descobre que seu veículo, o romance, é, antes de tudo, linguagem. Então, ele analisa os objetos com minúcia, mas em função do aprimoramento da linguagem, da sua capacidade em traduzir os refinamentos mais sutis que se possa conceber. E o caso de Gustave Flaubert e seu célebre Madame Bovary (1857). No Brasil, foi o caso de Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas e Raul Pompéia, com O Ateneu.

7 comentários:

  1. Adorei, muito bom! Só gostaria de saber as respostas para as questões.

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  2. Prometo lhe atender em breve. Peço um pouco de paciência que em breve colocarei as respostas aqui.

    Obrigado pelo comentário!

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  3. Muito bom o conteúdo, ótima explicação, tanto é que meu professor passou as mesmas questões como trabalho - hahaha - Como disse o outro ser acima, apenas gostaria de saber as respostas do mesmo. Grato ;D

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  4. Legal! Que bom que você gostou! Peço desculpas por ainda não ter colocado as respostas, mas prometo que, até este próximo final de semana, colocarei. Peço um pouco mais de paciência, pois estou muito ocupado esta semana, mas tenham certeza de que não esquecerei.
    Muito obrigado pelo comentário!!!

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  5. Ricardo, fico grato por ter dado as resposta, pois com elas pude sanar algumas dúvidas.

    ;)

    -sou o mesmo do comentário:

    Muito bom o conteúdo[...]

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  6. Estamos aí.
    Se precisar de alguma coisa é só postar um comentário.

    Eu que agradeço a atenção, fiz o blog justamente para esta finalidade. Que bom que gostou do conteúdo! Espero que meus alunos e outros estudantes saibam aproveitar dele também.
    Grande abraço!
    Tudo de bom!

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  7. Oi colega! Gostei bastante do teu blog e achei-o intressante. Agora, passa lá no meu e vamos "trocar figurinhas". Um abraço, Eneida
    http://caiunarededaeneida.blogspot.com

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